Mas talvez seja melhor começar pelo principio e ir ao verdadeiro Âmago da questão, fonte da pastelada nacional que ataca seres animais ou não no Portugal e que são as próprias pastelarias.Basta entrar num café de esquina para ser perceber imediatamente que a Europa ficou de fora e provavelmente nunca conseguirá entrar. Papéis no chão, beatas pro todos os lados, empregados suados e de cabelo oleoso, colónia de moscas exibindo bailados moribundos, homens façanhudos a beber bicas e a fumar SG's, mulheres redondas e de expressão bovina a devorar bolos do género quanto-mais-creme-melhor, crianças sujas e malcriadas a incomodar a mesa do lado, etc,etc. No ar pesado e sufocante, o ruído sobe ate ao tecto, abafando a morte recorrente dos insectos na chapa eléctrica que os grelha sem qualquer fim culinário.
E eis que entra um bando de adolescentes chilreantes, que aproveitam um furo ou uma balda para fumar uma cigarrada, beber a infalível bica e dizer mal dos professores e coleguinhas.
Outro animal que frequenta este habitat pestilento é o empregado de escritório,categoria administrativo, que chega a meio da manhã, esfregando as mãozinhas pela fuga à revelia, juntamente com mais um ou dois colegas da secção. Neste pequeno momento de felicidade que é a ida ao café, estes operários de secretária sentam-se confortavelmente nas cadeiras de fórmica castanho caca de bebé, apoiando os cotovelos na milimétrica mesinha que faz conjunto com o cadeirame, fumando selvaticamente e praguejando contra o chefe que não deu pela fuga dos seus assalariados.
Há ainda outro personagem obrigatório neste cenário: a senhora do cão a pilhas. A senhora do cão a pilhas, que é geralmente viúva, divorciada ou avençada, chega ao fim da manha depois de uma rebuscada e imaginativa toilette e come um duchese, duas tíbias e três palmieres recheados, tudo empurrado por um galão de máquina, enquanto conta a sua vida aos empregados que lhe vendem piropos e já não sabem o que lhe dizer.
No balcão estão expostos todos os artigos de doçaria susceptíveis de provocar altos níveis de colesterol, invariavelmente de fabrico caseiro, que escorrem cremes cor de gema de ovo, muito açúcar e farinha, muita massa e um número proibitivo de calorias.
E é por causa destes lugarejos inqualificáveis, que em cada dez esquinas ocupam nove, que o lisboeta desenvolveu o vício inútil do cafézinho com o bolinho, do suminho enlatadinho acompanhado do pastelinho servido num pratinho pequenino por um rapazinho magrinho de aventalinho e bandejinha que tem todas as probabilidades de se chamar Zezinho.
Grande verdade, embora um pouco triste é que Lisboa, tão pobre em ideias, é tão rica em pastelarias. Um mal nacional que dá razão a Eça e ao Herman quando dizia, na pele de um pasteleiro: "Eu é mais bolos". Entre bolos e pastéis, venha a moleza e escolha o que mais lhe convém. Vai um Jesuíta?
Crónica de Margarida Rebelo Pinto.
Uma boa surpresa! Continua, e um abraço do L.Filipe
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